Barbosismo e lacerdismo

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  • segunda-feira, 25 de novembro de 2013
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  • O barbosismo, o PT e o pós-julgamento
    A prisão de lideranças petistas, cercada de ilegalidade e manipulação, não marca apenas um divisor no partido. Ela coincide com uma transição de ciclo econômico
    O conservadorismo brasileiro construiu uma narrativa e a cercou de um cão de guarda. 
    Era forçoso que tivesse a pegada  agressiva das mandíbulas que travam e não soltam para dar conta das  cores  extremadas do enredo.
    O intento foi bem sucedido  mas o epílogo, inconcluso, está longe de entregar tudo o que prometeu.
    Joaquim Barbosa foi o homem certo, no lugar certo, na hora certa quando se tratou de tanger a AP 470  na direção das manchetes que a conceberam.
    O que se concebeu,  a partir de um crime eleitoral de caixa 2 , foi consumar aquilo que as urnas sonegavam: aleijar moralmente o campo progressista brasileiro; sepultar algumas de suas principais lideranças.
    Na verdade, o intercurso entre campanha política  e financiamento privado já havia punido o êxito progressista nos seus próprios termos.
    Subtraindo-lhe práticas, projetos e um horizonte ideológico, de cuja regeneração depende agora o seu futuro e a capacidade de liderar o passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.
    A prisão de lideranças petistas, cercada da ilegalidade e da manipulação sabidas, não marca apenas um divisor no partido.
    Ela coincide com uma transição de ciclo econômico mundial que impõe um novo repertório de escolhas estratégicas ao país e ao PT.
    Os limites assimilados na chegada ao poder talvez não sejam mais suficientes para se manter à frente dele nessa travessia.
    Em postagem em seu blog, antes da prisão, o ex-ministro José Dirceu resumiu o paradoxo ao criticar aqueles que hoje  –a exemplo do que se fez até 2008-- endossam a panaceia ortodoxa do choque de juros e de cortes orçamentários.
    “Para fazer isso não precisam  de nós’, advertiu o ex-chefe da Casa Civil de Lula.
    Quem –e o quê--  ditará  a agenda brasileira no pós-julgamento da AP 470  não é uma inquietação exclusiva do lado que ficou no banco dos réus.
    A emissão conservadora sabe que saturou um capítulo da disputa com a prisão algo decepcionante dos alvos mais graúdos.
    Parte do conservadorismo, porém, fica com água na boca.
    E sonha alto quando vê Joaquim Barbosa ladrar como se a teoria do domínio do fato, agora, significasse um dote imanente para atropelar réus, juízes e cardiopatas com a mesma truculência  biliosa exibida durante o julgamento.
    Delirantes enxergam um Carlos Lacerda negro nos palanques de 2014.
    Finalmente,  o elo perdido, a ponte capaz  de suprir o vazio de carisma à direita e de injetar paixão ao discurso  antipetista: o barbosismo.
    O engano conservador pode custar mais caro ao país do que custaria ao PT  ter o algoz como rival.
    Joaquim Barbosa tem de Lacerda apenas uma rudimentar mimetização de incontinência colérica.
    Tribuno privilegiado, o original  catalisou a oposição a Vargas. Ainda assim, o talento não foi suficiente para evitar os desdobramentos que se seguiram ao suicídio de 1954.
    Os desdobramentos foram de tal ordem que adiaram por uma década o golpe esmagado por Getúlio com um único tiro.
    É verdade que Lacerda , a exemplo de Barbosa hoje, foi também uma construção midiática.
    Ancorado nessa alicerce,  construiu um carisma  que insuflou a classe média contra a corrupção,  os sindicatos, os inimigos do capital estrangeiro e o desgoverno populista.
    Contra Vargas, sua voz ecoava simultaneamente na Rádio Globo, dos Marinhos e na Mayrink Veiga; a presença inflamada do udenista sacudia  também a  audiência da TV Tupi, de Assis Chateaubriant, a TV Rio  e a TV Record, da família Machado de Carvalho.
    Dispunha ainda do jornal Tribuna da Imprensa, criado em 1949, com o dinheiro do anti-getulismo local e estrangeiro.
    A voz de Lacerda era o que hoje é o Jornal Nacional, da Globo: a narrativa da direita endereçada a todo o Brasil.
    Por trás da retórica vulcânica, todavia, existia um substrato de aparente pertinência que sustentava o belicismo das suas inserções.
    Ao confronto internacional marcado pela consolidação comunista na China e a construção do Muro de Berlim, superpunha-se a emergência da Revolução cubana.
    Seja pela maior proximidade, seja pelos laços culturais, as transformações em Cuba  granjeariam  enorme receptividade na luta latino-americana contra o subdesenvolvimento e o apetite leonino do capital estrangeiro.
    Hoje,  ao contrário, a exacerbação conservadora só se sustenta pela instabilidade que o colapso do seu próprio ideário  –ainda sem resposta à altura--  acarreta urbi et orbi.
    E esse é o ponto fundamental da disputa no pós-AP 470.
    Colérico-dependente, Joaquim Barbosa  está muito distante das credenciais para se apresentar como a personificação do  salvador da pátria, diante dos desafios que se avizinham.
    O maneirismo é a única relação que existe entre o barbosismo  e o  lacerdismo.
    Ou o janismo.
    Maneirismo é a simulação afetada do original.
    Quanto mais se esmera em exacerbar as referências do que não é, maior o artificialismo que  exala.
    Mas isso só ficará definitivamente claro se o foco do debate for deslocado a partir de agora para o que é principal – e o que é principal requer do campo progressista algo mais do que a busca inercial do voto em 2014.
     
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