“Certamente, a política hoje parece em geral transitar para um estado de agregação que se destaca pela renúncia às perspectivas de futuro e à vontade criativa. O aumento de complexidade das matérias carentes de regulamentação força reações de certo fôlego, com margens de ação reduzidas. Como se os políticos tivessem se apropriado do olhar desmacarador da teoria dos sistemas, eles seguem descaradamente o roteiro oportunista de uma pragmática do poder orientada por pesquisas de opinião pública, a qual prescinde de todos os vínculos normativos. A moratória de energia nuclear é apenas o exemplo mais chamativo. E não Gutemberg, mas a própria chefe de governo “levou à mentira metade da República e quase a CDU inteira” (nas palavras do Frankfurter Allgemeine), quando manteve no cargo o autor do plágio publicamente comprovado em função de sua popularidade. Calculando friamente, ela confiscou a compreensão do cargo público próprio de um Estado de direito em troca de alguns poucos dinheiros, os quais, porém, não pôde depois embolsar nas urnas. Um Grande Rufo* selou a normalidade dessa prática.
A isso subjaz uma compreensão da democracia que, após a reeleição de George W. Bush, o New York Times formulou como post-truth democracy [democracia pós-verdade]. Na medida em que a política torna seu agir inteiro dependente da concordância com estados de ânimos que ela lastreia de eleição em eleição, o procedimento democrático perde seu sentido. Uma eleição democrática não existe para meramente retratar um espectro espontâneo da opinião; ao contrário, deve reproduzir o resultado de um processo público de formação da opinião. Os votos deixados nas cabines eleitorais só recebem o peso institucional da codeterminação democrática se vinculados a opiniões publicamente articuladas, que se formaram no intercâmbio comunicativo das tomadas de posição, das informações e das razões relevantes para o tema. Por essa razão, a lei fundamental privilegia os partidos, os quais, conforme o artigo 21, “cooperam na formação política da vontade do povo”. A União Europeia não poderá assumir um caráter democrático enquanto os partidos políticos evitarem apreensivamente tematizar em geral as alternativas para decisões de longo alcance”.
* Grofser Zapfenstrench: toque militar de um dos mais importantes cerimoniais alemães. Ele foi executado em homenagem ao ex-ministro da Defesa Karl-Theodor zu Guttemberg, logo após sua renúncia, em março de 2011, em virtude do plágio que cometeu em sua tese de doutorado (N. T.).”
(Cf. Sobre a constituição da Europa, São Paulo, Unesp, 2012).