OS EUA E A AGRICULTURA FAMILIAR.

Dr. Rosinha denuncia ofensiva dos EUA aos programas de apoio à agricultura familiar


Do PTnaCâmara  14/11/2013

O deputado Dr. Rosinha (PT-PR), em discurso na tribuna da Câmara na semana passada, fez duras críticas ao que considera uma “ofensiva” dos Estados Unidos sobre as políticas públicas do governo brasileiro. O petista cita o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Compra Direta e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) como alvos de ataque do governo de Barack Obama para favorecer o setor agrícola do seu país.

“O Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Ministério do Desenvolvimento Social têm feito uma política de incentivo à pequena produção da agricultura familiar. Os Estados Unidos ameaçam, agora, levar o Brasil à OMC [Organização Mundial do Comércio], dizendo que isso é subsídio”, denunciou Rosinha.

“Nós sabemos que a União Europeia e os próprios Estados Unidos fazem subsídios de bilhões — não são milhões — de dólares ou de euros, na União Europeia, para a agricultura. E, no caso dos Estados Unidos, não é um subsídio para produção, é um subsídio para exportação, o que demonstra um favorecimento das grandes empresas”, lembrou o parlamentar, que preside a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara. Rosinha ressaltou que o Compra Direta, por exemplo, é voltado para abastecer hospitais, escolas, entidades filantrópicas e restaurantes populares. “Ou seja, atendendo à economia popular”, disse. No caso do Pronaf, o deputado destacou que se trata de um instrumento de crédito cujos recursos são pagos pelos agricultores familiares.

Em relação ao PNAE, Rosinha frisou que o Congresso aprovou a lei que estabelece que pelo menos 30% dos alimentos do programa sejam fornecidos pela agricultura familiar. “São incentivos à produção e não subsídios à produção da agricultura familiar. Nós temos de condenar essa proposição feita agora pelo Barack Obama”, cobrou o petista. Conab – No pronunciamento, Rosinha também criticou a política do Ministério da Agricultura em relação à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). “Ele [o ministério] quer fazer da CONAB um instrumento do agronegócio e não um instrumento da agricultura familiar. E usa de vários métodos, de vários mecanismos, desde assédio moral a seus servidores até, inclusive, perseguição aos movimentos sociais”, protestou o deputado.
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EUA - O complexo de Sansão.


O Complexo de Sansão - Por Immanuel Wallerstein


Wallerstein sustenta: crise do sistema-mundo capitalista produz divisão rara entre poderosos e gera enorme instabilidade. Será preciso definir projetos alternativos
Na Bíblia, há a famosa lenda do herói Sansão. São muitas as interpretações sobre seu significado; mas Sansão, um israelita cuja força era originária de Deus, põe abaixo o templo os inimigos filisteus (também muito poderosos), morrendo no processo. Seu sentido, imagino, é dizer que um ato aparentemente irracional (Sansão morre) pode ser ao mesmo tempo heróico e inteligente, porque se converte na saída (possivelmente a única) para derrotar um inimigo forte e “salvar seu povo”.
Parece que temos um punhado de supostos Sansões, atualmente. Estão bloqueando, ou procurando bloquear, o que consideram ser “compromissos” perigosos com o inimigo. O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, está dizendo que “um mau acordo é pior que nenhum acordo”. Ele refere-se ao que enxerga como o acordo entre os EUA e a Rússia, em torno da Síria; e a um possível acordo entre Washington e Teerã. Na Colômbia, o ex-presidente conservador [Alvaro Uribe] está investindo contra seu sucessor, também conservador [Juan Manuel Santos], porque este está em negociações com as FARC, sob os auspícios de Cuba e do Brasil.
E, é claro, temos as não-negociações maciças, em curso nos Estados Unidos. Nelas, os membros de ultra-direita do Congresso, em especial na Câmara dos Representantes, estão usando sua força para vetar qualquer comprimosso com as forças inimigas lideradas pelo presidente Obama e o Partido Democrata. Veem como “inimigo interno” todos os republicanos que buscam algum tipo de “compromisso”.
Não é difícil mostrar que todos estes Sansões estão botando a casa abaixo não apenas sobre seus inimigos mas também sobre si mesmos. Para eles, contudo, mesmo que isso seja verdadeiro, há um timing a considerar. Estão convencidos de que precisam agir agora, enquanto têm forças para fazê-lo. Do contrário, o inimigo vencerá e poderá institucionalizar – ou manter – o mal que estaria sendo cometido.
Este tipo de luta ideológia, impermeável ao chamado pragmatismo, não foi inventado nos últimos dez ou vinte anos. É tão velho quanto a socialização humana. Mas assumiu uma característica especial agora, precisamente porque estamos nos espamos de uma crise estrutural em nosso sistema-mundo capitalista. Numa crise estrutural, pode-se esperar dois grandes fenômenos: enorme confusão intelectual e, como consequência, mudanças selvagens de atitude, que conduzem, por sua vez, a guinadas ainda mais bruscas.
Como há cada vez mais grupos prontos para botar o templo abaixo, mesmo que sejam também esmagados, quem parece mais confuso e indeciso sobre o que fazer é o chamado Establishment. Foram-se os dias em que ele podia cinicamente manobrar e obter o que queria. Não é mais verdade que “plus ça change, plus c’est la même chose” – ou seja, que as mudanças são apenas aparentes.
Que podemos fazer, os que buscamos mudanças reais, um sistema-mundo distinto do que prevaleceu ao menos nos últimos 500 anos? A primeira coisa é não nos prendermos aos debates e guinadas selvagens entre os Sansões e os Establishments. Realmente não importa qual deles vença, no curto prazo.
A segunda coisa que deveríamos fazer é não disperdiçar toda nossa energia lamentando o fato de que quem deseja mudanças fundamentais (a chamada esquerda global) não parece estar unida, ou ter clareza sobre seus objetivos, ou envolvida em ações e organização urgentes. O fato é que ela própria está envolta na confusão, pelo menos no momento.
O fato de o templo estar caindo é algo muito além de nossas forças para contê-lo – mesmo que o desejássemos. Mas não somos obrigados a permanecer sob a avalanche das rochas. Precisamos tentar escapar. Podemos estar certos de que os membros mais poderosos do Establishment também estão tentando.
Mas como escapar, e com que objetivos? Também nós precisamos ter senso de timing, e lembrar a diferença entre o curto prazo (três anos ou menos) e o médio prazo (os próximos vinte a quarenta anos).
No curto prazo, as pessoas (os 99%) estão sofrendo. Precisamos lutar para reduzir sua dor, uma luta que deve assumir múltiplas formas. Podem ser pressões por leis, ou decisões de órgãos do Estado, que ajudem de modo imediato os necessitados, ou evitem danos maiores ao ambiente, ou protejam direitos de populações como os indígenas ou as chamadas minorias sociais.
Mas no médio prazo, precisamos tentar esclarecer a natureza das estruturas que queremos construir, se formos bem-sucedidos na encruzilhada que nosso sistema-mundo atravessa. Precisamos tentar entender não apenas os objetivos de médio prazo da direita mundial, mas a natureza de suas profundas divisões internas. A chamada esquerda está profundamente dividida, também. Precisamos trabalhar para superar isto.
Nada é fácil, neste tempo de transição de um sistema-mundo para outro. Mas tudo é possível – ainda que inteiramente incerto.
Imagem: Francisco Goya, Duelo com porretes (1823, detalhe) | Tradução: Antonio Martins
Fonte: http://outraspalavras.net/ 
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GEOPOLÍTICA - O Brasil e a América Latina.


O Brasil e a América Latina, segundo Perry Anderson – por Marco Aurélio Weissheimer




O neoliberalismo segue aprofundando seu poder no mundo. Só na América do Sul a direção adotada tem sido a contrária, com maior ênfase no papel do Estado e no controle público e menos nas privatizações. A América Latina está no contrafluxo, sendo portadora de uma esperança que não existe em nenhum outro lugar do mundo hoje. E esse processo traz uma novidade importante. A maior nação do continente, o Brasil, não está na retaguarda como estava em 1820, mas sim na linha de frente. O Brasil foi o primeiro país latino-americano a cancelar uma viagem aos EUA, que costuma ser um tradicional exercício de humildade para os governos da região. Tudo isso ainda é uma obra em andamento, concluiu, mas é um processo no contrafluxo da ideologia mundial dominante que representa uma esperança para outros lugares do mundo.

A avaliação é do historiador marxista britânico, Perry Anderson, que esteve em Porto Alegre, segunda-feira (14), para uma conferência no evento Fronteiras do Pensamento. De 1815 a 2013: a América Latina e o concerto político das nações. Esse foi o tema abordado pelo historiador na conferência proferida no Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Perry Anderson partiu de uma sugestão básica: a coisa mais próxima do sistema internacional de estados que vemos no início do século 21 é a ordem política estabelecida na Europa, na primeira metade do século 19, com o Congresso de Viena, conferência entre embaixadores das grandes potências europeias de então, realizada entre 1814 e 1815, com o objetivo de redesenhar o mapa político do continente após a derrota de Napoleão. Essa conferência, assinalou o historiador, resulto em um novo concerto político entre as nações europeias que se estendeu até por volta de 1853, quando eclodiu a Guerra da Crimeia. Esse concerto instituiu uma frente política entre as cinco grandes potências da época – Inglaterra, Rússia, Prússia, Áustria e França - cujos objetivos principais eram evitar o surgimento de levantes revolucionários e de novas guerras no território europeu.

Os governos dessas potências formaram uma pentarquia com o objetivo de preservar a paz no continente e, é claro, defender seus interesses políticos e econômicos. Assim como ocorre em nossos dias, como nos casos do Iraque e do Afeganistão, os integrantes da pentarquia do Congresso de Viena enfrentaram tentativas de sublevações no território europeu. Essas tentativas vieram, indicou Perry Anderson, e foram reprimidas na Itália, na Espanha e na Hungria, por tropas da Áustria, da França e da Rússia, respectivamente. Estabeleceu-se uma forma de equilíbrio, uma coordenação estabilizadora, que a Europa até então não conhecia. Durante cerca de quarenta anos, até a Guerra da Crimeia, não houve qualquer guerra importante na Europa e nenhuma sublevação.

Esse período costuma ser apontado por historiadores como um avanço civilizatório, assinalou ainda Perry Anderson. Desde o Renascimento a Europa não conhecera um período de paz tão prolongado. Os países que compunham a pentarquia tinham, é certo, importantes diferenças entre si. A Rússia czarista estava numa categoria a parte, pois ainda era uma monarquia feudal. A Grã-Bretanha, por sua vez, era a única potência capitalista avançada. Esses dois países eram as duas potências militares da época: a Grã-Bretanha possuindo o maior poder naval, e a Rússia o maior poder terrestre. Esses dois poderes hegemônicos, destacou o historiador, expandiram seus impérios, enquanto os demais disputaram franjas na periferia (a França, na Argélia e na Indochina, por exemplo, os Estados Unidos no México e outros países europeus na África, especialmente).

O que vai acabar destruindo a paz de Viena são conflitos na periferia desses impérios, como ocorreu com o barril de pólvora dos Balcãs que detonou a Primeira Grande Guerra Mundial. A partir daí, instala-se um período de anarquia competitiva entre as grandes potências que resultará em duas sangrentas guerras mundiais, como se sabe. Depois, entre 1945 e 1989, o sistema político internacional será regido pela Guerra Fria, com dois blocos opostos disputando influência no mundo. Esse período chegará ao fim em 1991, com a desaparição da União Soviética. Hoje, destacou Perry Anderson, vivemos outra metamorfose do sistema político internacional com o surgimento de uma espécie de nova pentarquia, constituída por Estados Unidos, União Europeia, Rússia China e Índia. O historiador apontou as particularidades desses novos candidatos a donos do mundo:

A União Europeia comanda o maior PIB do planeta, mas segue sendo uma confederação incompleta de Estados. A Rússia, embora bem menor que a União Soviética, ainda possui a maior massa de terras do mundo e o segundo arsenal nuclear. A Índia, em breve, será o país mais populoso do mundo e também é uma potência nuclear. Os Estados Unidos são o maior poder econômico, financeiro, tecnológico e militar. E a China é um regime comunista que preside a economia mais dinâmica do pós-guerra.

Na avaliação de Perry Anderson, estamos vivendo um lento processo de cristalização de um consenso entre essas nações. Um consenso baseado em algo mais prosaico, do que ocorreu no Congresso de Viena, mas, por outro lado, mais complexo. O perigo maior não é a ameaça da guerra, mas sim a interdependência econômica que prende essas nações em um abraço mútuo. “As principais ameaças para a estabilidade vêm da possibilidade de desordem econômica. É por isso que algo equivalente ao que foi feito no Congresso de Viena, foi criado por meios dos fóruns do G4, G7 e G20”, observou o historiador.

O risco maior para a estabilidade política internacional hoje, enfatizou, é o estouro de crises financeiras como a que ocorreu em 2008. “O início do século 21 está muito distante do universo polarizado do pós-guerra. A globalização unificou os interesses objetivos subjacentes desses países e a legitimidade interna dessas grandes potências depende da manutenção do crescimento econômico. O temor comum de todas elas é o de um colapso desse crescimento”.

E a América Latina o que tem a ver com tudo isso? Perry Anderson estabeleceu um paralelo entre os movimentos de independência e de libertação colonial que ocorreram no continente latino-americano quando o sistema político europeu era regido pelo Congresso de Viena e o recente ciclo de governos progressistas na região que caminham na contramão da ortodoxia neoliberal que domina a economia mundial. Quando a contrarrevolução triunfou na Europa, com o Congresso de Viena, a América Latina viveu um momento de emancipação. Um dos fatores que contribuiu para isso, no âmbito da política europeia, foi o enfraquecimento da Espanha que era objeto de preocupação por parte da pentarquia. Em 1823, exemplificou o historiador, uma revolução liberal na Espanha foi esmagada pela França. E será a Grã-Bretanha que ditará as condições e os termos da independência brasileira.

Com o colapso do sistema do Congresso de Viena, a América Latina ganhou espaço para respirar e se reavivar politicamente. A primeira grande revolução do século XX, lembrou Anderson, ocorreu no México. “Os Estados Unidos estavam muito preocupados com a Primeira Guerra Mundial e a situação de anarquia internacional”. Seguiram-se outros processos revolucionários em países como Nicarágua, El Salvador, Cuba, Bolívia, Chile, Peru e Venezuela, entre outros. Onda após onda, as revoltas populares marcaram a América Latina no século 20. No último quarto do século, houve uma guinada neoliberal em praticamente todo o continente. Pela primeira vez, destacou o historiador, o continente estava alinhado com a ideologia dominante do capitalismo global.

No século 21, isso mudará abruptamente com o surgimento de governos de esquerda e progressistas na Venezuela, Brasil, Argentina, Uruguai, Bolívia, Equador, Peru e Chile. “Raramente essas experiências se articulavam como ocorreu no início deste século”, apontou. Nenhuma dessas experiências é igual, reconheceu Perry Anderson, mas elas apresentam um fato comum. “Com todas as restrições e ressalvas necessárias, há um fato que é expressivo. O neoliberalismo segue aprofundando seu poder no mundo. Só na América do Sul a direção adotada tem sido a contrária, com maior ênfase no papel do Estado e no controle público e menos nas privatizações. Esse é um panorama similar ao que tivemos no século 19. Com as guerras no Iraque e no Afeganistão, os Estados Unidos deixaram a região um pouco de lado. A América Latina está no contrafluxo, sendo portadora de uma esperança que não existe em nenhum outro lugar do mundo hoje”.

E uma novidade importante desse processo, disse ainda Anderson, é que a maior nação do continente, o Brasil, não está na retaguarda como em 1820, mas sim na linha de frente. “O Brasil não faz parte da pentarquia (“por não ter armas nucleares e estar muito longe da Eurásia, entre outras razões”, mas em vez disso, oferece ao mundo um novo horizonte de reformas sociais”. Falando sobre o recente episódio da espionagem praticada pela Agência Nacional de Segurança dos EUA contra o governo e empresas do Brasil, Perry Anderson destacou a reação da presidenta Dilma Rousseff: “Foi o primeiro país latino-americano a cancelar uma viagem aos EUA, que costuma ser um tradicional exercício de humildade para os governos da região”. Tudo isso ainda é uma obra em andamento, concluiu, mas é “um processo no contrafluxo da ideologia mundial dominante que representa uma esperança para outros lugares do mundo”.

Fonte: http://www.cartamaior.com.br/
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EUA - O labirinto americano.

Noam Chomsky e o labirinto americano.


Ele sustenta: na Síria, Washington adotou lógica da Máfia, e perdeu; no Congresso, Obama é vítima da ultradireita, que age como os nazistas

Noam Chomsky é, aos 84 anos, um dos maiores intelectuais no mundo. Seu trabalho e suas realizações são bem conhecidos – ele é linguista norte-americano, professor emérito no Massachussets Institute of Technology (MIT) há mais de 60 anos, analista e ativista político constante, crítico original do capitalismo e da ordem mundial que tem como centro os Estados Unidos

Nesse entrevista, Chomsky debate a paralisação do governo norte-americano, por disputas incessantes no sistema político e, em especial, chantagem das forças de direita mais primitivas. Também aborda os sinais de perda de influência de Washington na Síria e da emegência, na América do Sul, de um conjunto de governos que afasta-se dos EUA, pela primeira vez em dois séculos.

Gostaria de começar com a paralisação recente do governo dos EUA. Por que ela é diferente dessa vez, se já aconteceu no passado?
Noam Chomsky: Paul Krugman fez há dias, no New York Times, um ótimo comentário a respeito. Lembra que o partido republicano é minoritário entre a opinião pública e controla a Câmara [House of Representatives, que junto do Senado representa o Legislativo nos EUA]. Está levando o governo à paralisação e talvez ao calote de suas dívidas. Conseguiu a maioria por conta de inúmeras artimanhas. Obteve uma minoria de votos, mas a maioria das cadeiras. Está se utilizando disso para impor uma agenda extremamente nociva para a sociedade. Foca particularmente a questão do sistema de saúde público.

Os EUA são o único, entre os países ricos e desenvolvidos, que não possue um sistema nacional de saúde pública. O sistema norte-americano é escandaloso. Gasta o dobro de recursos de países comparáveis, para obter um dos piores resultados. E a razão para isso é ser altamente privatizado e não-regulado, tornando-se extremamente ineficiente e caro. Aquilo que alguns chamam de “Obamacare” é uma tentativa de mudar esse sistema de forma suave – não tão radicalmente como seria desejável – para torná-lo um pouco melhor e mais acessível.

O Partido Republicano escolheu o sistema de saúde como alavanca para conquistar alguma força política. Quer destruir o Obamacare. Essa posição não é unânime entre os republicanos, é de uma ala do partido – chamada de “conservadora”, de fato, profundamente reacionária. Norman Orstein, um dos principais comentaristas conservadores, descreve o movimento, corretamente, como uma “insurgência radical”.

Então, há uma insurgência radical, que implica grande parte da base republicana, disposta a tudo – destruir o país, ou qualquer coisa, com o intuito de acabar com a Lei de Assistência Acessível (o Obamacare). É a única coisa a que foram capazes de se agarrar. Se falharem nisso, terão de dizer a sua base que mentiram para ela, ao longo dos últimos cinco anos. Por isso, estão dispostos a ir até onde for necessário. É um fato incomum – penso que único – na história dos sistemas parlamentaristas modernos. É muito perigoso para o país e para o mundo.

Como a paralisação poderia terminar?
Bem, a paralisação por si só é ruim – mas não devastadora. O perigo real surgirá nas próximas semanas. Há, nos Estados Unidos, uma legislação rotineira – aprovada todo ano – que permite ao governo tomar dinheiro emprestado. Do contrário, ele não funciona. Se o Congresso não autorizar a continuação da tomada de empréstimos, talvez o governo peça moratória. Isso nunca aconteceu e um calote do governo norte-americano não seria muito prejudicial apenas aos EUA. Ele provavelmente afundaria o país, de novo, numa profunda recessão – mas talvez também quebre o sistema financeiro internacional. É possível que encontrem maneiras para contornar a situação, mas o sistema financeiro mundial depende muito da credibilidade do Departamento do Tesouro dos EUA. A credibilidade dos títulos de dívida emitidos pelos EUA é vista como “tão boa quanto ouro”: esses papéis são a base das finanças internacionais. Se o governo não conseguir honrá-los, eles não possuirão mais valor, e o efeito no sistema financeiro internacional poderá ser muito severo. Mas para destruir uma lei de saúde limitada, a extrema direita republicana, os reacionários, estão dispostos a fazer isso.

No momento, os EUA estão divididos sobre como o tema será resolvido. O ponto principal a observar é a divisão no Partido Republicano. O establishment republicano, junto com Wall Street, os banqueiros, os executivos de corporações não querem isso – de maneira nenhuma. É parte da base que deseja, e tem sido muito difícil controlá-la. Há uma razão para terem um grande grupo de delirantes em sua base. Nos últimos 30 ou 40 anos, ambos os partidos que comandam a política institucional dos EUA inclinaram-se para a direita. Os democratas de hoje são, basicamente, aquilo que se costumava chamar, há tempos, de republicanos moderados. E os republicanos foram tanto para a direita que simplesmente não conseguem votos, na forma tradicional.

Tornaram-se um partido dedicado aos muito ricos e ao setor corporativo – e você simplesmente não consegue votos dessa maneira. Por isso, têm sido compelidos a mobilizar eleitores que sempre estiveram presentes no sistema político, mas eram marginais. Por exemplo, os extremistas religiosos. Os EUA são um dos expoentes no que se refere ao extremismo religioso no mundo. Mais ou menos metade da população acredita que o mundo foi criado há alguns milhares de anos; dois terços da população está aguardando a segunda vinda de Cristo. A direita também teve de recorrer aos nativistas. A cultura das armas, que está fora de controle, é incentivada pelos republicanos. Tenta-se convencer as pessoas de que devem se armar, para nos proteger. Nos proteger de quem? Das Nações Unidas? Do governo? Dos alienígenas?

Uma enorme parcela da sociedade é extremamente irracional e agora foi mobilizada politicamente pelo establishment republicano. Os líderes presumem que podem controlar este setor, mas a tarefa está se mostrando difícil. Foi possível perceber isso nas primárias republicanas para a presidência, em 2012. O candidato do establishment era Romney, um advogado e investidor em Wall Street – mas a base não o queria. Toda vez que a base surgia com um possível candidato, o establishment fazia de tudo para destruí-lo, recorrendo, por exemplo, a ataques maciços de propaganda. Foram muitos, um mais louco que o outro. O establishment republicano não os quer, tem medo deles, conseguiu nomear seu candidato. Mas agora está perdendo controle sobre a base.
Sinto dizer que isso tem algumas analogias históricas. É mais ou menos parecido com o que aconteceu na Alemanha, nos últimos anos da República de Weimar. Os industriais alemães queriam usar os nazistas, que eram um grupo relativamente pequeno, como um animal de combate contra o movimento trabalhista e a esquerda. Acharam que podiam controlá-los, mas descobriram que estavam errados. Não estou dizendo que o fenômeno vai se repetir aqui, é um cenário bem diferente, mas algo similar está ocorrendo. O establishment republicano, o bastião corporativo e financeiro dos ricos, está chegando em um ponto em que não consegue mais controlar a base que mobilizou.

Na política externa, as notícias sobre a Síria sumiram da mídia convencional, desde a aprovação do acordo para confiscar as armas químicas do arsenal de Assad. Você pode comentar esse silêncio?
Nos EUA, há pouco interesse sobre o que acontece fora das fronteiras. A sociedade é bem insular. A maioria das pessoas sabe bem pouco sobre o que acontece no mundo e não liga tanto para isso. Está preocupada com seus próprios problemas, não têm o conhecimento ou o compreensão sobre o mundo ou sobre História. Quando algo, no exterior, não é constantemente martelado pela mídia, esta maioria simplesmente não sabe nada a respeito.

A Síria vive uma situação muito ruim, atrocidades realmente terríveis, mas há lugares muito piores no mundo. As maiores atrocidades das últimas décadas têm ocorrido no Congo – na região oriental –, onde mais ou menos 5 milhões de pessoas foram mortas. Nós – os EUA – estamos envolvidos, indiretamente. O principal mineral em seu celular é o coltan, que vem daquela região. Corporações internacionais estão lá, explorando os ricos recursos naturais Muitas delas bancam milícias, que estão lutando umas contra as outras pelo controle dos recursos, ou de parte deles. O governo de Ruanda, que é um cliente dos EUA, está intervindo maciçamente, assim como Uganda. É praticamente uma guerra mundial na África. Bem, quantas pessoas sabem disso? Mal chega à mídia e as pessoas simplesmente não sabem nada a respeito.

Na Síria, o presidente Obama fez um discurso sobre o que chamou de sua “linha vermelha”: não se pode usar armas químicas; pode-se fazer de tudo, exceto utilizar armas químicas. Surgiram relatórios credíveis, afirmando que a Síria utilizou essas armas. Se é verdade, ainda está em aberto, mas muito provavelmente é. Nesse ponto, o que estava em jogo é o que se chama de credibilidade. A liderança política e os comentaristas de política externa indicavam, corretamente, que a credibilidade norte-americana estava em jogo. Algo precisava ser feito para mostrar que nossas ordens não podem ser violadas. Planejou-se um bombardeio, que provavelmente tornaria a situação ainda pior, mas manteria a credibilidade dos EUA.

O que é “credibilidade”? É uma noção bem familiar – basicamente, a noção principal para organizações como a Máfia. Suponha que o Poderoso Chefão decida que você terá que pagá-lo, para ter proteção. Ele tem de “bancar” essa afirmação. Não importa se precisa ou não do dinheiro. Se algum pequeno lojista, em algum lugar, decidir que não irá pagá-lo, o Poderoso Chefão não deixa a ousadia impune. Manda seus capangas espancá-lo sem piedade, ainda que o dinheiro não signifique nada para ele. É preciso estabelecer credibilidade: do contrário, o cumprimento de suas ordens tenderá a erodir. As relações exteriores funcionam quase da mesma maneira. Os EUA representam o Poderoso Chefão, quando dão essas ordens. Os outros que cumpram, ou sofram as consequências. Era isso que o bombardeio na Síria demonstraria.

Obama estava chegando a um ponto do qual, possivelmente, não seria capaz de escapar. Não havia quase apoio internacional nenhum – sequer da Inglaterra, algo incrível. A Casa Branca estava perdendo apoio internamente e foi compelida a colocar o tema em votação no Congresso. Parecia que seria derrotada, num terrível golpe para a presidência de Obama e sua autoridade. Para a sorte do presidente, os russos apareceram e o resgataram com a proposta de confiscar as armas químicas, que ele prontamente aceitou. Foi uma saída para a humilhação de encarar uma provável derrota.
Faço comentário adicional. Você perceberá que este é um ótimo momento para impor a Convenção sobre Proibição de Armas Químicas no Oriente Médio. A verdadeira convenção, não a versão que Obama apresentou em seu discurso, e que os comentaristas repetiram. Ele disse o básico, mas poderia ter feito melhor, assim como os comentaristas. A Convenção sobre Proibição de Armas Químicas exige que sejam banidas a produção, estocagem e uso delas – não apenas o uso. Por que omitir produção e estocagem? Razão: Israel produz e estoca armas químicas. Consequentemente, os EUA irão evitar que tal convenção seja imposta no Oriente Médio. É um assunto importante: na realidade, as armas químicas da Síria foram desenvolvidas para se contrapor às armas nucleares de Israel, o que também não foi mencionado.

Você afirmou recentemente que o poder norte-americano no mundo está em declínio. Para citar sua frase em Velhas e Novas Ordens Mundiais, de 1994, isso limitará a capacidade dos EUA para “suprimir o desenvolvimento independente” de nações estrangeiras? A Doutrina Monroe está completamente extinta?
Bem, isso não é uma previsão, isso já aconteceu. E aconteceu nas Américas, muito dramaticamente. O que a Doutrina Monroe dizia, de fato, é que os EUA deviam dominar o continente. No último século isso de fato foi verdade, mas está declinando – o que é muito significativo. A América do Sul praticamente se libertou, na última década. Isso é um evento de relevância histórica. A América do Sul simplesmente não segue mais as ordens dos EUA. Não restou uma única base militar norte-americana no continente. A América do Sul caminha por si só, nas relações exteriores. Ocorreu uma conferência regional, cerca de dois anos atrás, na Colômbia. Não se chegou a um consenso, nenhuma declaração oficial foi feita. Mas nos assuntos cruciais, Canadá e EUA isolaram-se totalmente. Os demais países americanos votaram num sentido e os dois foram contra – por isso, não houve consenso. Os dois temas eram admitir Cuba no sistema americano e caminhar na direção da descriminalização das drogas. Todos os países eram a favor; EUA e Canadá, não.

O mesmo se dá em outros tópicos. Lembre-se de que, algumas semanas atrás, vários países na Europa, incluindo França e Itália, negaram permissão para sobrevoo do avião presidencial do boliviano Evo Morales. Os países sul-americanos condenaram veementemente isso. A Organização dos Estados Americanos, que costumava ser controlada pelos EUA, redigiu uma condenação ácida, mas com um rodapé: os EUA e o Canadá recusaram-se a subscrever. Estão agora cada vez mais isolados e, mais cedo ou mais tarde, penso que os dois serão, simplesmente, excluídos do continente. É uma brusca mudança em relação ao que ocorria há pouco tempo.

A América Latina é o atual centro da reforma capitalista. Esse movimento poderá ganhar força no Ocidente?
Você está certo. A América Latina foi quem seguiu com maior obediência as políticas neoliberais instituídas pelos EUA, seus aliados e as instituições financeiras internacionais. Quase todos os países que se orientaram por aquelas regras, incluindo nações ocidentais, sofreram – mas a América Latina padeceu particularmente. Seus países viveram décadas perdidas, marcadas por inúmeras dificuldades.

Parte do levante da América Latina, particularmente nos últimos dez a quinze anos, é uma reação a isso. Reverteram muitas daquelas medidas e se moveram para outra direção. Em outra época, os EUA teriam deposto os governos ou, de uma maneira ou de outra, interrompido seu movimento. Agora, não podem fazer isso.

Recentemente, os EUA testemunharam o surgimento de seus primeiros refugiados climáticos – os esquimós Yup’ ik – na costa sul na ponta do Alaska. Isso coloca em mórbida perspectiva o impacto humano no meio ambiente. Qual é sua posição acerca dos impostos sobre emissões carbono e quão popular pode ser tal medida nos EUA ou em outro país?

Acho que é basicamente uma boa ideia. Medidas muito urgentes têm de ser tomadas, para frear a contínua destruição do meio ambiente. Um imposto sobre carbono é uma maneira de fazer isso. Se isso se tornasse uma proposta séria nos EUA, haveria uma imensa propaganda contrária, desencadeada pelas corporações – as empresas de energia e muitas outras –, para tentar aterrorizar a população. Diriam que, em caso de criação do tributo, todo tipo de coisa terrível aconteceria. Por exemplo, “você não será mais capaz de aquecer sua casa”… Se isso terá sucesso ou não, dependerá da capacidade de organização dos movimentos populares.

Entrevista a Harrison Samphir, no Znet | Tradução: Vinícius Gomes | Imagem de HikingArtist

Fonte: http://outraspalavras.net/

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Espionagem americana abre caminho para o Brasil ter caças russos

Espionagem americana abre caminho para o Brasil ter caças russos

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Espionagem americana abre caminho para o Brasil ter caças russos

14 de outubro de 2013 | 17:50
O jornalista Mauro Santayanna antecipa, em seu blog, a possibilidade de uma reviravolta no programa de reaparelhamento da Força Aérea Brasileira, associando a compra dos jatos de quarta geração Sukhoi SU-35 – como os Boeing F-18, os  franceses Rafael e os Grippen, da Suécia, selecionados no programa FX-2, da FAB – com participação no projeto – atualmente em testes, do moderníssimo T-50, quase invisível ao radar como o seu correspondente americano F-22 Raptor.
Um amigo com relações na Aeronáutica me diz que o SU-35 que participou da concorrência do programa FX-2 não foi eliminado por deficiências operacionais, mas por dúvidas quanto à transferência de tecnologia, ajudadas por uma “pressão amiga” dos americanos.
Nos últimos meses, os russos têm emitido sinais contínuos de que transferir tecnologia não será problema. E voltam à carga com o oferecimento de uma parceria nos jatos que o sucederão, o que havia sido oferecido em 2008, chegando a ser objeto de um protocolo de intenções, mas foi recusado pelo Ministro da Defesa da época, Nelson Jobim.
O escândalo da espionagem americana pode ter mudado completamente os planos de voo da alta cúpula da FAB.
Por: Fernando Brito
 
Do Blog TIJOLAÇO.
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