INAUGURADA A TEMPORADA DE CAÇA AO PETRÓLEO BRASILEIRO

Por Paulo Metri, veiculado pelo “Correio da Cidadania”


“Nos dias atuais, proliferam veículos, na mídia brasileira, que utilizam a desinformação. Como exemplo, surgem artigos, editoriais, notícias e entrevistas dizendo que 'as rodadas de leilão de áreas para produzir petróleo devem ser realizadas', 'a Petrobras não tem capacidade para explorar sozinha o Pré-Sal devido a suas limitações financeira, gerencial e tecnológica' e, para “ajudar o Brasil” a vencer essa dificuldade, 'as empresas petrolíferas estrangeiras precisam ser convidadas'.

Nessas mensagens [afirmam que], para atraí-las, é necessário que as concessões do Pré-Sal sejam firmadas sob as regras da [dadivosa para estrangeiros] lei nº 9.478 [de FHC/PSDB/DEM], o que significa revogar no Congresso a lei 12.351 [de 2010], recém-aprovada, devolvendo o Pré-Sal à antiga lei 9.478 [de FHC].

Trata-se de arrogância sem igual, típica de quem se acha imbatível. Para tentar convencer os leitores ou espectadores, supondo todos desatentos, lançou-se mão de inverdades, acreditando que ninguém vai contestar um grande jornal, revista semanal, rádio ou televisão. Arquitetaram, com grande esmero, o que pode ser chamado de a “temporada de caça ao petróleo brasileiro”. Felizmente, existem alguns sites, blogs e veículos digitais que estão dispostos a conscientizar a população e publicam novos dados e análises.

Contudo, a mídia do capital, aquela que não prioriza a sociedade [nacional], às vezes comete erros, por partir do princípio de que o povo tem um baixo nível de compreensão política. Durante dez anos seguidos (de 1999 a 2008), existiram rodadas de leilões de áreas para exploração de petróleo. Nunca trouxeram para seus veículos uma voz que advogasse a não realização dessas rodadas. Em compensação, disseminaram matérias contando as supostas 'maravilhas das rodadas'. Os leitores ou espectadores atentos devem pensar: “Que estranho insistirem tanto em um mesmo ponto!”.

Neste instante, eles querem ter acesso a algo, não necessariamente divergente, mas com diferente ângulo de visão, e não encontram, porque essas matérias só existem na imprensa alternativa. Mais cedo ou mais tarde, eles conhecerão os veículos livres, comprometidos com as causas sociais, e entenderão que a grande mídia é um braço camuflado do capital, principalmente o internacional.

Na atual temporada de caça ao nosso petróleo, inúmeras matérias de comunicação satisfazem, sem serem explícitas, aos interesses estrangeiros sobre nosso petróleo. Se fosse rebater cada material divulgado, este artigo iria ficar longo e cansativo; então, comento a seguir as principais acusações dos detratores.

Começo pela que diz que, "depois da descoberta do Pré-Sal, o Brasil, em vez de começar a exportar petróleo, está se distanciando da autossuficiência". Para explicar o que ocorre, é preciso desenvolver um raciocínio preliminar.

A velocidade que o governo brasileiro impôs à exploração no setor de petróleo, com uma rodada de leilões por ano, de 1999 até 2008, foi do interesse único das empresas estrangeiras, que não têm petróleo em seus países de origem, e dos países desenvolvidos, que precisam do petróleo para mover suas economias. Se não forçassem a Petrobras a ter que participar de tantos leilões, mais recursos sobrariam para o desenvolvimento de campos e a autossuficiência estaria garantida há mais tempo. Por outro lado, em cada leilão que a Petrobras não participa e não ganha, há uma perda enorme para o país. Além disso, é preciso saber que, entre a declaração de comercialidade de um campo marítimo e o início da sua produção, são necessários, em média, cinco anos.

Entretanto, estamos hoje bem próximos da autossuficiência, o que não ocorreria, com absoluta certeza, se em 1953 [com Getúlio Vargas] o projeto de interesse das petrolíferas estrangeiras tivesse sido aprovado. No nosso país, hoje, não existiria a Petrobras e a produção nacional seria mínima. As empresas estrangeiras não iriam para a plataforma continental quando a Petrobras foi, em 1974, pois a lógica do capital as levaria para a Arábia Saudita, o Iraque, o Cazaquistão e outros lugares promissores para o petróleo, como de fato ocorreu. Também, certamente ninguém saberia, hoje, da existência do Pré-Sal.

É interessante que não se conta, para garantir a autossuficiência, com o petróleo produzido no país pelas empresas estrangeiras. De forma pouco soberana, raciocina-se que esse petróleo é delas e elas não têm a obrigação de abastecer o Brasil. Essa falta de lógica social é resguardada pela [antinacional] lei 9.478 de 1997 [de FHC/PSDB/DEM] e é parte do pensamento subserviente da década de 1990, que imaginava o Brasil como economia complementar à dos desenvolvidos, mero exportador de minerais e produtos agrícolas.

Como boas críticas neoliberais, as matérias lembram sempre "os prejuízos da Petrobras no segundo trimestre de 2012". Ela teve prejuízo porque o governo determinou que segurasse o preço dos derivados, uma vez que os aumentos desses preços repercutem muito no índice de inflação. Não se pode beneficiar o cidadão brasileiro em detrimento dos dividendos maravilhosos que seriam dados aos acionistas? Não se pode fazer isso eternamente, mas, de vez em quando, se pode. Além disso, os acionistas [muitos estrangeiros] não vão ficar sem dividendos. Só não vão ter aqueles maravilhosos.

Acusam gratuitamente as mudanças do setor porque "modificaram o sistema de royalties", fato catastrófico, porque desencadeou no Congresso disputa entre os parlamentares dos diferentes estados sobre a distribuição dos mesmos. É verdade que discutir o sistema de royalties foi catastrófico, mas o que os autores não percebem é que, mesmo que a lei 9.478 [de FHC] fosse utilizada para o Pré-Sal, os parlamentares iriam querer modificar seus artigos que estabelecem a distribuição dos royalties arrecadados. O que atraiu esses parlamentares a buscarem mudar essa distribuição foi a perspectiva de arrecadações milionárias desse tributo, quando o Pré-Sal entrasse em operação.

Criticam a lei 12.351 [de 2010] por atribuir à Petrobras participação obrigatória de 30% em cada consórcio e por essa empresa ser a operadora única dos novos contratos do Pré-Sal, determinações essas que “seriam desnecessárias”, além de outros adjetivos pesados. Assim, transmitem a visão que nos desejam impingir, a qual favorece as empresas estrangeiras.

A Petrobras ser a operadora dos consórcios é primordial, pois quem compra bens e serviços para as fases de exploração, desenvolvimento e produção é a operadora. E, dentre as empresas que atuam no Brasil, só a Petrobras compra aqui. As empresas estrangeiras ganharam áreas para explorar petróleo desde 1999 e, até hoje, 14 anos depois, nenhuma delas comprou uma plataforma no Brasil. Os 30% são explicados porque nenhuma empresa consegue ser a operadora com menos de 30% de participação no consórcio.

Criar nova empresa estatal para gerir o programa, que também é motivo de crítica, é na verdade muito importante para, dentre outros objetivos, fiscalizar as contas de todos os consórcios.

Finalizando, os autores invariavelmente criticam o governo por procurar "viabilizar uma exploração do Pré-Sal que visa satisfazer a sociedade". Neste momento, dizem que “o governo tenta ressuscitar a ideologia nacionalista de outros tempos”.

Buscam impor o conceito de que “nacionalismo é ruim”. E trazem, como única crítica ao nacionalismo, o fato de ser “de outros tempos”. Além de ser um preconceito contra o velho, chega a ser engraçado, porque princípios liberais estão nos [antigos] textos de Adam Smith (1723-1790).

Aliás, seria bom reconhecermos que, graças ao nacionalismo, o Pré-Sal é nosso. Em primeiro lugar, porque o nacionalismo o descobriu. Em segundo lugar, porque foram visões nacionalistas de órgãos do governo brasileiro que lutaram para o estabelecimento da “Zona Econômica Exclusiva de 200 milhas”, onde se encontra mais de 90% do nosso Pré-Sal. E a conquistaram junto às Nações Unidas.”

FONTE: escrito por Paulo Metri e veiculado pelo “Correio da Cidadania”. O autor é conselheiro da Federação Brasileira de Associações de Engenheiros e do Clube de Engenharia. Artigo transcrito no portal “Viomundo”  (http://www.viomundo.com.br/denuncias/paulo-metri-inaugurada-a-temporada-de-caca-ao-petroleo-brasileiro.html). [Imagem do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
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Brasil: UM ANACRONISMO CHAMADO "DIREITA"

Carlos Lacerda

“A direita brasileira, atavicamente, de certo modo até hoje segue tentando derrubar Vargas. Talvez o fantasma de que a direita deva se livrar não seja essa mescla de Lula e Vargas, mas o de Carlos Lacerda. Que, pelo menos, era um escriba e um orador brilhante. Coisa que hoje a direita carece.

[A criação por Getúlio Vargas da Petrobras como nacional aumentou a fúria da direita e da mídia, que defendiam, como sempre, os interesses estrangeiros prioritariamente. Getúlio estancou a escalada golpista com o suicídio]

Por Flávio Aguiar, de Berlim

"O senhor Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à Presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar." (Carlos Lacerda [da UDN, que hoje seria ±DEM/PSDB], em 1º. de junho de 1950, no jornal “Tribuna da Imprensa”).

Visto de longe (apesar da imediatez da internet, mas ela também distancia) o Brasil continua parecendo um desajuste temporal.

Antigamente, quando o Brasil era o país do futuro, ele parecia um túnel do tempo, rumando do passado ("atraso") para a "modernidade" ("progresso") mais ou menos "conservadora" [i.e. direitista, elitista], conforme o gosto do freguês. Ou dos donos da loja, do futuro, do poder e do Brasil. Houve aquele intervalo de certo período milagroso da ditadura, quando esta apregoava: “agora, o futuro chegou”. E o futuro não era um sonho, era um pesadelo.

Agora, as coisas estão um pouco diferentes. De algum modo, aos trancos e barrancos, o futuro, de novo, chegou. Mas, desta vez, chegou mesmo. O Brasil continua com suas desigualdades, com seus achaques, com seus muros da vergonha social. Mas, de algum modo, está avançando em melhorar a vida de seus cidadãos, em todos os sentidos. Enquanto em boa parte do resto do mundo – inclusive aqui na Europa “desenvolvida” – as sociedades marcham em sentido contrário.

Mas, no Brasil, há um lastro chamado "direita". Que não aceita, inclusive, esse nome. Talvez seu problema começa aí: um problema de identidade, de nascença, de família, sei lá. O mote da direita brasileira continua sendo aquela famosa frase de Carlos Lacerda sobre Getúlio Vargas, proferida em 1950.

Lacerda procurava se antecipar ao que iria acontecer: a inevitável eleição de Vargas. Eleito este, a UDN tentou, primeiro, reverter o resultado no tapetão do Tribunal, argumentando que Vargas não tivera maioria absoluta. Como a Constituição não exigia isso, não adiantou. Continuou tentando derrubá-lo, instalou um poder paralelo na Base Aérea do Galeão e outro na mídia, até seu suicídio em 1954.

O suicídio, aparentemente, teve efeito paradoxal. Deixou um vácuo de herança para história do Brasil. O resultado foi que, atavicamente, a direita continuou tentando derrubar Vargas. Continua, de certo modo, tentando até hoje. Em 1961, por detrás da imagem de Jango, ainda pairava o fantasma daquele homem/esfinge. Em 64 idem, atrás de Brizola. Houve a famosa outra frase de FHC, depois de sua primeira eleição, sobre “o fim da era Vargas”.

Agora, a direita transfere essa tara (no sentido de peso) histórica para Lula. Inconformada, olha no retrovisor e tenta ainda anular a eleição de 2002.

Reverter a história. Fazê-la enquadrar-se na sua alucinação de que é “moderna” no país do “atraso”, quando ela dá mostras seguidas de senilidade histórica. Ela, a direita, é o atraso, o retardo, e peso bruto que quer impedir o vôo do balão – o papagaio que seja – chamado Brasil.

Isso se consubstanciou nesse erro crasso da direita midiática e do candidato Serra em transformar o julgamento do “processo 470”, no STF, no grande trunfo político da eleição de 2012. Houve, em primeiro lugar, um erro de “timing”. O tema do chamado “mensalão” tinha tudo para não se tornar relevante numa eleição de caráter municipal. Mas... havia um outro problema por trás dessa escolha. É que a direita não tinha outra coisa a dizer nem propor. Mergulhada na crise histórica de identidade que se aprofunda, e no esfrangalhamento de suas cúpulas divididas pela presença de um autêntico “peso morto” como centroavante de seu time – o candidato José Serra – a direita deixou-se levar pela autoimagem no espelho – no seu espelho, é claro: como na década de 50, a campeã da “moralidade pública” contra a “lama” – “mar de lama”, de Vargas.

Não funcionou. O disco ficou girando sozinho, sem agulha para tocar. Em São Paulo, o que se viu, por exemplo, foi uma curiosa versão daquela teoria da “pedra n’água”, usada como a “inelutável” explicação para a “inevitável” derrota de Lula em 2006. Primeiro, ela atingiria as classes e regiões mais “esclarecidas”, para se espalhar em círculos concêntricos pelas classes e regiões “mais atrasadas”. Em S. Paulo, afastados Russomano e Chalita do segundo turno, o que se viu foi a “pedra” Haddad se firmar na periferia da cidade e comer pelas bordas, ou até pelo núcleo mesmo, como no bairro de Santa Ifigênia, a candidatura de José Serra onde esta deveria ter seus redutos.

Agora, a direita, na mídia e fora dela, às vezes parte para a tentativa de reverter o resultado histórico, tentando construir uma imagem de “empate técnico”, para dizer o mínimo, onde houve uma fragorosa derrota sua. É claro que o PT tem derrotas a analisar, como em Manaus, e Belo Horizonte, para a direita, além de outras. Mas deve analisar, sobretudo, o significado do crescimento de seu – afinal – aliado, o PSB, como em Recife, e o enredamento nas próprias pernas, como em Porto Alegre, além de outros partidos terem também análises a fazer. Mas isso seria um assunto para outro artigo.

Neste, fica o registro de que – apesar de minhas inclinações e preferências – acho que faria muito bem ao Brasil uma direita mais moderna e “up to date” com o mundo que ela acha que está em contato, na Europa, nos Estados Unidos ou no Japão. Há tantos exemplos que ela poderia seguir, aqui na Alemanha, por exemplo, da vetusta CDU de Angela Merkel à direção do SPD alemão, uma direção sem dúvida de centro-direita, procurando alfaiates para um corte tipo século XXI.

Ao invés de ficar aferrada a seu ideário-anos-cinquenta, não se deve candidatar, não deve ser eleito, não deve governar. Mesmo que seja 50 anos depois, ou mais.

Talvez o fantasma de que a direita deva se livrar não seja essa mescla de Lula e Vargas, mas o de Carlos Lacerda. Que, pelo menos, era um escriba e um orador brilhante. Coisa que hoje a direita carece.”

FONTE: escrito por Flávio Aguiar, correspondente internacional da “Carta Maior” em Berlim  (http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5839) [Imagens do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
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A derrota de Serra e a renovação

Alberto Carlos Almeida 

No dia 10 de agosto, publiquei nesta coluna um artigo cujo título era: "Serra é o favorito para perder". Nele, fiz a previsão, baseada em dados, de que Serra seria derrotado na eleição para prefeito. O argumento era simples e direto. Serra disputou a eleição como o candidato apoiado pelo prefeito Kassab. Como Kassab tinha uma avaliação muito ruim, a soma de "ótimo" e "bom" dele estava abaixo de 30% e a tendência seria de que não melhoraria, então seu candidato seria derrotado. Acabamos de ver em São Paulo uma eleição de mudança. O raciocínio do eleitor é simples: se o governo está ruim, então ele deve ser mudado; se o governo está bom, então deve ser mantido. Nada mais eloquente quanto a isso do que o fato de que, em toda a série de pesquisas do Datafolha simulando o segundo turno entre Haddad e Kassab, a partir do início de setembro, a vantagem do petista jamais se alterara, como não mudou a soma de "ótimo" e "bom" de Kassab.

Além disso, e também nesta coluna, publiquei um artigo em 23 de março, na antevéspera das prévias do PSDB, mostrando que Serra tinha um histórico de candidato ruim de voto, de candidato que tinha dificuldades para vencer. Mais do isso, nesse artigo chamei atenção para o erro que seria para o PSDB não renovar, não disputar a eleição paulistana com um nome novo. Foi inacreditável que os tucanos tenham escolhido alguém que acabara de perder uma eleição presidencial para uma candidata que nunca havia disputado um voto na vida. Nesse artigo chamei atenção para o fato de que, se o PSDB escolhesse Serra, estaria optando pelo lema de campanha "em time que está perdendo não se mexe". Foi exatamente o que aconteceu.

O PSDB poderia ter sido bem mais competitivo na eleição de São Paulo. Bastaria que tivesse escolhido um nome desvinculado da administração de Kassab. Um candidato com esse perfil ficaria livre para criticar a prefeitura e se colocar como oposição. Fazer exatamente o que Haddad, o vitorioso, fez. Nomes com esse perfil não faltaram e se colocaram nas prévias do partido: José Aníbal e Ricardo Trípoli. Bruno Covas também poderia ter sido esse candidato de oposição, mas decidiu, conciliatoriamente, não concorrer às previas e apoiar Serra. O próprio resultado dessa consulta interna do partido já indicava as dificuldades que Serra enfrentaria. Ele venceu com pouco mais de 50%, o que revelou uma grande rejeição junto àqueles que, teoricamente, deveriam desejar ardentemente que fosse candidato.

O PSDB impediu a renovação, tanto agora como em 2010. Caso Aécio tivesse sido candidato a presidente naquela ocasião, agora seria um nome nacionalmente reconhecido e muito dificilmente haveria a especulação que hoje há sobre Eduardo Campos como possível candidato de oposição em 2014. A eleição em São Paulo teve o mesmo desfecho. Se José Aníbal ou Ricardo Trípoli tivesse sido o escolhido, mesmo derrotado, um deles abriria perspectivas futuras mais promissoras para o partido. Serra é um político em fim de carreira, ainda que se considere revigorado pela derrota.

Fernando Henrique e outros importantes líderes do PSDB declararam, após essa nova derrota de Serra, que o partido precisa de renovação. Levar a sério esse propósito implica não oferecer uma secretaria de Estado para Serra. É hora de o velho político se retirar do cenário. É hora de abrir espaço para outras figuras que esperam que a fila ande. Isso premiaria a lealdade política. É algo importante, porque Serra não é leal a Alckmin, como foi possível constatar na eleição municipal de 2008.

Considerando-se a fama de bem preparado, surpreendem os erros crassos cometidos por Serra em todas as eleições nas quais foi derrotado, em particular na última eleição presidencial. Naquela oportunidade, ele era o candidato de oposição a um governo muito bem avaliado. Tudo indicava que iria perder, inclusive os dados de pesquisas realizadas mais de um ano antes das eleições. Mesmo assim, quis ser candidato. Não fosse esse erro, ele seria hoje um importante ator político, seria reeleito governador de São Paulo e estaria ocupando o segundo cargo mais importante do Brasil. A propósito, Serra jamais será presidente.

As decisões erradas de Serra contrastam com as decisões corretas de Lula. A escolha de Fernando Haddad para prefeito de São Paulo não foi uma renovação em qualquer direção. Pelo contrário, Lula sabe que a cidade de São Paulo é conservadora. Por isso, sua indicação recaiu em um quadro político que se assemelhasse ao mundo tucano. Haddad é professor universitário, tem sólida formação acadêmica e foi ministro da Educação. Nada mais importante para os conservadores do que a educação: é graças a ela que as pessoas podem melhorar de vida pelo próprio mérito. Além disso, Haddad tinha o que mostrar como gestor público durante a campanha. A principal peça de comunicação da campanha petista não foi o bilhete único mensal nem a rede Hora Certa de consultas médicas, mas o próprio candidato.

Mais interessante ainda é como Lula escolhe seus objetivos políticos. Na eleição de 2010 o ex-presidente teve duas metas claras: eleger sua sucessora e aumentar o número de cadeiras do PT no Senado. Várias decisões de aliança abrindo mão de candidaturas a governos estaduais foram tomadas com a finalidade principal de conseguir maioria no Senado. Hoje, o PT tem a segunda maior bancada de senadores, em 2010 elegeu figuras de destaque em seus respectivos Estados, como Lindberg Farias no Rio de Janeiro, Gleisi Hoffman no Paraná, Walter Pinheiro na Bahia, José Pimentel no Ceará e Humberto Costa em Pernambuco. Agora em 2012, a prioridade foi vencer em São Paulo.

Política é relação de poder. Não existe na política a visão cristã de que o certo vence no final e o errado é derrotado. O motivo é simples: não há um lado certo ou errado; são apenas ideologias que estão em jogo. Não existe um Deus acima do bem e do mal que aponte que um lado é o correto e o outro é o errado. Por isso existem as eleições. E há as circunstâncias, que são de grande importância. Muito dificilmente um candidato ligado a Kassab venceria em 2012. Ainda mais, sendo esse candidato alguém como Serra, sem carisma e pouco agregador. O que Lula e seus liderados fizeram foi aproveitar as circunstâncias favoráveis a um candidato de oposição. É bem verdade que, em algum momento da campanha, o risco de o candidato do PT não ir para o segundo turno se tornou grande. Mas, como diz o ditado popular, quem não arrisca não petisca.

Lula sempre foi um tomador de risco. Para aqueles que prezam o empreendedorismo, cumpre reconhecer que, dos anos 1980 para cá, Lula vem sendo o maior empreendedor político do Brasil. A trajetória dele no mundo político se inicia como a maioria dos empreendedores. Lula não tinha nada a perder quando fez a transição do sindicalismo para a política. Não tinha um partido, fundou um e iniciou do zero. Foi por isso que pôde ser candidato a presidente três vezes consecutivas para só vencer na quarta tentativa. O PT ainda era um partido muito pequeno, com pouca competição interna. Agora que o PT é grande e em São Paulo há muitas estrelas, Lula decidiu assumir outro tipo de risco, o de indicar um candidato novato em eleições, um marinheiro de primeira viagem. Ele continua arriscando e empreendendo. Mudou a forma e o estilo, mas o conteúdo é o mesmo.

Depois de oito anos na Presidência, Lula passou a combinar essas características de personalidade com o enorme aprendizado político que teve. Hoje, o PT conta com Dilma cuidando do governo federal e Lula cuidando de conquistar mais espaço político para seu partido. É uma óbvia vantagem sobre seus adversários. Ainda mais quando Serra é visto como alguém eleitoralmente competitivo.

Caso o PSDB leve a sério as palavras de renovação pronunciadas esta semana por seus líderes, será bom para todo o sistema político, inclusive para o PT. Renovar hoje significa livrar-se de Serra, impedi-lo de ser candidato a qualquer cargo majoritário, o que inclui o Senado. É o PT que está obrigando o PSDB a se renovar. Por outro lado, uma eventual renovação do PSDB vai obrigar o PT também a se renovar ainda mais. O Brasil ganhará com isso.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e "O Dedo na Ferida: Menos Imposto, Mais Consumo"
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A LUZ AMARELA PARA O PSDB, por Marcos Coimbra

Por Marcos Coimbra

LUZ AMARELA PARA O PSDB

“O terceiro turno da eleição municipal começou antes mesmo de o segundo terminar. Enquanto os eleitores ainda votavam, a disputa pelo troféu do “grande vencedor” já estava em curso.

Políticos, lideranças partidárias, observadores e comentaristas entraram em campo desde a manhã de domingo, apresentando sua interpretação do “sentido da eleição” e decretando quais eram, a seu ver, os ganhadores e os perdedores.

Em política, como em várias coisas na vida, às vezes importa mais a versão que o fato. Adequadamente embalada, a narrativa sobre o ocorrido pode até prevalecer sobre o que efetivamente se passou.

É possível ganhar e ser derrotado, assim como perder e posar como vencedor. Depende, no fundo, de quão alto se bate o bumbo na propagação da versão que sobrepuja as outras.

Não que seja decisivo esse terceiro turno. No final da eleição municipal de 2008, por exemplo, a mídia se encheu de análises que afirmavam que o PMDB havia se tornado a “noiva cobiçada” na disputa presidencial seguinte.

Falso. O partido já era, desde a eleição legislativa de 2006, desejado como parceiro por petistas e tucanos, fundamentalmente por ter eleito a maior bancada na Câmara e ter vasto tempo de televisão. Não era por ter muitos prefeitos em cidades pequenas e algumas capitais que queriam se casar com ele.

Todos sabem que isso conta pouco na hora de ganhar a eleição para o Planalto. Pela simples razão que a maioria dos eleitores não acha relevante ouvir o prefeito quando escolhe o candidato a presidente.

Para as oposições e os setores da sociedade - e da imprensa - mais hostis ao que chamam lulopetismo, o terceiro turno da eleição recém-concluída está sendo complicado.

De um lado, precisam reduzir o significado do desempenho objetivo de Lula e do PT, especialmente em função do resultado em São Paulo. De outro, têm que produzir “vencedores”, nem que seja às custas de alguma prestidigitação.

O fato é as eleições foram ruins para as oposições. Em especial, para o PSDB.

De 2004 para cá, o total de prefeitos que elegeu, junto com o DEM e o PPS, caiu quase à metade. O número de vereadores diminuiu - apesar do aumento de vagas. Suas bases municipais, tão necessárias para a eleição legislativa, estão se esgarçando ano após ano.

O PSBD não fez, em 2012, o prefeito de nenhuma das 7 capitais das regiões Sul e Sudeste – sequer apresentou candidato em 3 e foi derrotado em 4. No segundo turno, ganhou apenas 5 prefeituras nas 34 cidades dessas regiões que o realizaram.

Saiu-se bem na região Norte e em algumas capitais menores do Nordeste.

Em São Paulo, foi derrotado na capital e viu o PT vencer em 7 das 10 maiores cidades do estado.

Na tentativa de desqualificar a vitória de Fernando Haddad, começou a circular, desde a semana passada, a tese de que é de Serra a responsabilidade exclusiva pela debacle. Que, em outras palavras, o único derrotado foi ele.

Dizer, no entanto, que “A culpa é do Serra!”como até Kassab se apressa em declarar – expressa apenas parte da verdade.

O que foi julgado e reprovado o ultrapassa: um discurso, uma proposta de governo, uma “turma”. O eleitorado da cidade rejeitou mais que um indivíduo.

Os problemas do PSDB preocupam a democracia. Quando a oposição legítima se enfraquece, abre-se o caminho para toda sorte de fantasia extra-política. É nesse vazio que viceja o golpismo [sem alusão à PGR e ao STF/mídia...].

Quem perde a esperança de vencer na urna faz de tudo para levar o jogo para o tapetão.”

FONTE: escrito por Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi. Transcrito no portal de Luis Nassif  (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-luz-amarela-para-o-psdb-por-marcos-coimbra) [Imagem do Google e trecho entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
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A COBERTURA DO MENSALÃO E A FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA

Formador da opinião pública

MÍDIA, CORRUPÇÃO E OPINIÃO PÚBLICA

Por Venício A. de Lima, no “Observatório da Imprensa”

“A cobertura homogênea que a grande mídia vem fazendo do julgamento da Ação Penal nº 470 – [estranhamente planejado para ser] paralelo ao período de campanha eleitoral – e os resultados das eleições municipais de 2012 recolocam a questão da formação da opinião pública, da percepção que ela tem sobre a corrupção e das consequências políticas dessa percepção, em particular na decisão do voto.

Em artigo anterior, neste “Observatório” (“Poder da mídia, contradições e (in)certezas“) – reproduzi resultado e comentário do IBOPE sobre pesquisa comparada que registrou as “preocupações dominantes” dos brasileiros nos anos de 1989 e 2010. Diz o comentário:

Apesar das constantes notícias sobre o assunto, o combate à corrupção também preocupa menos o brasileiro: de 20%, passou a ser citada por 15% dos entrevistados.”

Perguntava, então: qual a relação da queda da preocupação do brasileiro com a corrupção e as “constantes notícias” – uma verdadeira campanha de moralidade seletiva e criminalização da política – veiculadas na grande mídia desde 2005?

Ao contrário do que o artigo possa ter sugerido, não há resposta simples para essa questão.

PESQUISAS SOBRE CORRUPÇÃO

O livro “Corrupção e Sistema Político no Brasil”, organizado pelos professores Leonardo Avritzer e Fernando Filgueiras, do “Centro de Referência do Interesse Público” (CRIP) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), lançado recentemente pela editora “Civilização Brasileira”, é uma coletânea de análises de resultados de pesquisas nacionais – realizadas em 2006, 2008 e 2009 – que investigam o tema da corrupção em variadas dimensões.

No capítulo escrito pela professora Rachel Meneguello (Unicamp), por exemplo, pesquisa realizada no ano eleitoral de 2006, dentro do ESEB – Estudo Eleitoral Brasileiro coordenado pelo CESOP/UNICAMP, chega a conclusões aparentemente divergentes daquelas do IBOPE em relação à hierarquia das “preocupações dominantes” dos brasileiros: a corrupção aparece não só como “problema mais importante debatido na eleição de 2006”, como “principal problema político do país” (cf. tabela abaixo).

Por outro lado, em duas pesquisas realizadas pelo CRIP-UFMG junto com o Instituto Vox Populi, em 2008 e 2009, a corrupção é percebida por quase a totalidade da opinião pública como constituindo um problema muito grave ou grave (cf. gráfico abaixo).

Gráfico 1. A gravidade da corrupção (%)

O que as análises indicam, no entanto, é uma “dificuldade” da percepção da opinião pública sobre a corrupção ser transferida para o comportamento eleitoral.

Rachel Meneguello diz explicitamente:

O que nos intriga é a “independência” entre as percepções sobre a corrupção [...], pois ela coloca uma distância entre a ideia de democracia e as noções de transparência e de controle do tráfico de influência. [...] Os dados de dezembro de 2006, coletados após a reeleição do presidente Lula, não apenas mostraram que as denúncias de corrupção não foram suficientes para punição do governo, mas, sobretudo, que a avaliação retrospectiva que influencia o voto do eleitor é multidimensional e envolve identificação política, ideologia e avaliação de desempenho do sistema em outras dimensões, como a economia e as políticas de redistribuição de renda. Os dados indicam uma zona nublada, na qual reside um juízo normativo sobre a corrupção que não afeta de forma significativa o comportamento político mais imediato do eleitor ou a avaliação e o apoio ao sistema político. Essa área parece ser o nó entre o impacto da corrupção e as bases da adesão democrática — como diminuir a distância entre a percepção, o juízo moral e a prática política” (pp. 81-82, passim).

A AUSÊNCIA DA MÍDIA

Infelizmente, dos nove capítulos do livro, apenas dois enfrentam diretamente a questão central da mídia, não só em relação à formação da opinião pública, como, sobretudo, de sua influência específica nas percepções sobre a corrupção em suas várias dimensões.

No capítulo escrito pela editora de Política do jornal “Valor Econômico” (pertencente aos grupos [de direita] Folha e Globo), a jornalista Maria Cristina Fernandes admite que:

A imprensa é parte da disputa democrática pelo Estado, e a essa serve tanto em benefício de sua explicitação quanto no acobertamento de seus ditames. Há uma lógica jornalística que lhe é própria e nem sempre se encaixa nos pressupostos da teoria vigente. Domina a imprensa uma concepção ainda difusa de defesa da cidadania no âmbito da qual a corrupção aparece como fenômeno difuso e descolado de interesses consolidados e duradouros. Esse descolamento impede não apenas o esclarecimento dos nexos de interesse que dão corpo e materialidade à corrupção, mas também obstrui seu combate efetivo pela sociedade e pelo Estado. Este (capítulo) [...] tentará mostrar que o espaço ocupado pelas denúncias tem sido inversamente proporcional à identificação dos interesses em disputa nas campanhas eleitorais. E a hipótese aqui levantada é que essa relação guarda causa e efeito.” (p. 203)

Além disso, ao analisar a Tabela 7 [abaixo] – que só aparece no seu capítulo – Maria Cristina comenta:

Tabela 7. Favorecimento da mídia na apuração de escândalos/2009

A pesquisa corrobora a tese de que a mídia nem sempre trafega com independência pelos interesses em conflito, mas também questiona a visão de que os meios de comunicação exercem um poder ilimitado sobre os cidadãos. Mais da metade dos entrevistados acredita que a mídia favorece alguém ou algum grupo na divulgação dos escândalos. E essa percepção cresce na medida em que os níveis de renda e escolaridade se elevam. No Sudeste, onde se concentra a sede dos maiores jornais e emissoras de rádio e TV, é maior a crença de que a mídia é injusta e parcial ao cobrir escândalos de corrupção” (p. 217).

Na verdade, são os entrevistados que responderam a essa questão no Centro-Oeste, no Norte e no Sudeste (e não na média nacional) que acreditam que “a mídia favorece alguém ou algum grupo na divulgação dos escândalos”.

De qualquer forma, esse dado combinado com outro que não está no livro, mas publicado no site “Contas Abertas” quando os resultados da pesquisa CRIP/Vox Populi foram divulgados em março de 2010 (cf. quadro abaixo), compõem um panorama bastante expressivo sobre a percepção da opinião púbica sobre a grande mídia brasileira.

Vale dizer, boa parte da opinião pública não só acredita que “a mídia é injusta e parcial ao cobrir escândalos de corrupção”, como entre 2008 e 2009, houve uma queda de 18% [ou 30% dos entrevistados] no número daqueles que percebiam a mídia como sendo imparcial e subiu em 50% o número daqueles que acreditavam que ela era parcial (de 26% para 39%).

EM SUA OPINIÃO, A MÍDIA COSTUMA SER MAIS: 2008//2009

--Imparcial: 60%//42%; Parcial26%//39%;

--Não sabe/não respondeu: 14%//19%

--Total: 100%//100%
Número de entrevistados: 2421//2400
Fonte: “Relatório de pesquisa de opinião pública – Interesse Público e Corrupção” – julho/2008 e julho/2009 – “Vox Populi e CRIP”.

MÍDIA COMO OBSTÁCULO

O outro capítulo do livro que enfrenta diretamente a questão da mídia foi escrito pelo professor Juarez Guimarães, da UFMG. Propondo uma pesquisa conceitual a partir dos dados empíricos da pesquisa CRIP/Vox Populi, ele identifica duas linguagens distintas de diagnosticar e combater a corrupção: numa, predomina a razão liberal e, na outra, a razão republicana.

A razão liberal é amplamente hegemônica na cobertura da grande mídia e se articula em torno de três núcleos de ideias: a corrupção dos políticos e do Estado é cada vez maior no Brasil; a base político-econômica dessa expansão da corrupção está no alargamento da intervenção do Estado e de suas funções e empresas; e, a base político-social desse fenômeno caracteriza um neopopulismo, com arranjos corporativos escusos, formação de clientelas, arrivismos nutridos no Erário e até, eventualmente, a formação de uma “nova classe financeira”.

Já a razão republicana, fundada no conceito de formação da República democrática brasileira, se estrutura em torno de três blocos de ideias: reconhece que está em curso um amplo e profundo processo de formação de uma cultura cidadã; idem que está em movimento, ao mesmo tempo, uma macrorreestruturação dos fundamentos econômicos e sociais da sociedade civil brasileira e um novo ciclo participativo (...) fazendo a interação entre instituições e movimentos ou representações sociais; e ibidem que está em processo inicial, diferenciado e desigual de formação republicana das instituições e dos procedimentos do Estado brasileiro, instituições exemplificadas na construção da Controladoria-Geral da União (CGU) e suas agendas.

Para Juarez Guimarães, além da ausência de financiamento privado dos partidos nas eleições, o grande obstáculo ao processo de formação republicana no Brasil é o “domínio privatista e oligopolista da mídia que desconecta os processos de formação da cultura cidadã e da opinião pública”.

Afirma ele:

Tratam-se de cinco fenômenos mutuamente configurados: grave redução do pluralismo político e cultural; supervocalização de alguns interesses privados e subvocalização de vastos setores sociais; deformação sistemática da objetividade da notícia e, inclusive, de uma legitimação da calúnia como instrumento de ação política; e partidarização indevida ou não revelada de canais e de meios de comunicação que deveriam ser públicos. É evidente que esse obstáculo à formação da opinião pública em uma sociedade democrática de vastas população e territorialidade incide sobre a percepção do fenômeno da corrupção, em particular devido à nítida matriz liberal que predomina quase inteiramente na mídia empresarial” (p. 100).

“A CORRUPÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO”

Na mesma linha do argumento republicano de Juarez Guimarães, o professor João Feres Júnior (IESP-UERJ), em artigo republicado no site do CRIP-UFMG sob o sugestivo título “A grande mídia e a corrupção do espaço público“, alertou recentemente:

Os órgãos da grande mídia continuam os mesmos, com os mesmos poucos donos, os mesmos editores e colunistas conservadores, os mesmos jornalistas. E esse constitui o principal problema da democracia brasileira atual: a corrupção do espaço público. A grande mídia ainda é responsável em boa medida pela informação da maior parte da população e, dessa maneira, é influente na formação da opinião pública. [...] Temos aqui uma tensão estrutural em uma sociedade que é ao mesmo tempo democrática e capitalista. A propriedade privada dos meios de comunicação, particularmente em seu formato oligopolizado, conduz à usurpação do espaço público em prol dos interesses dos poucos grupos que detêm os meios. Na prática, os proprietários têm poder de veto e de agenda sobre tudo o que é informado ao público. [...] A corrupção do espaço público é o calcanhar de Aquiles da democracia brasileira, e esse é um calcanhar enfraquecido, luxado, distendido. Sem um sistema de informação plural e responsável, não teremos uma formação saudável da opinião pública. Sem uma opinião pública bem informada, como poderemos esperar o aprimoramento das instituições, o avanço das questões normativas que se colocam constantemente perante uma sociedade democrática (proibição do porte de armas, aborto, eutanásia, bioética etc.) e mesmo a eleição de melhores quadros de representantes?”

Diante de todos esses dados e análises – alguns, aparentemente contraditórios – e para além dos efeitos de curto prazo identificados (ou não) nos processos eleitorais, é inegável que a grande mídia desempenha papel de longo prazo na formação da opinião pública, incluindo, por óbvio, a percepção sobre a corrupção.

O que está de facto em jogo, no entanto, é “a corrupção do espaço público” como obstáculo central à construção de uma democracia republicana. Ela não será possível sem que se criem as condições estruturais necessárias para a formação de uma opinião pública democrática, plural e diversa. Vale dizer, para que mais vozes sejam ouvidas e participem do espaço público através da universalização da liberdade de expressão.

A ver.”

FONTE: escrito por Venício A. de Lima, jornalista e sociólogo, pesquisador visitante no Departamento de Ciência Política da UFMG (2012/2013), professor de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor de “Política de Comunicações: um Balanço dos Governos Lula (2003-2010)”, “Editora Publisher Brasil”, 2012, entre outros]. Artigo extraído do “Observatório da Imprensa” e transcrito no site “Carta Maior”  (http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5838) e no portal de Luis Nassif  (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-cobertura-do-mensalao-e-a-formacao-da-opiniao-publica) . [Imagem do Google e trecho entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
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